As relações familiares transformam-se junto com as mudanças e avanços do mundo contemporâneo, na tecnologia, nas relações, no trabalho e na educação. No início do século a função de educar as crianças cabia exclusivamente a família e as diferenças entre os papéis sociais do pai e da mãe eram nítidas. Enquanto o homem era o responsável por trabalhar e trazer o dinheiro, a mulher ficava em casa cuidando do lar e dos filhos. Com a saída da mulher de casa para o mundo do trabalho, a educação das crianças foi delegada a terceiros, sendo esses instituições como a escola ou as babás.
Na atualidade, novas possibilidades de configurações familiares tornaram-se possíveis, tanto devido a evolução da medicina, das legislações como também de uma maior aceitação social à diversidade presente na nova geração. No século XX mesmo depois da entrada da mulher no mercado de trabalho, as relações entre educadores e educandos eram verticais, tanto na escola como no ambiente familiar. As crianças tinham seu papel social e suas funções escolares que deveriam ser cumpridas à risca, e naquela época as crianças não tinham muitas possibilidades de escolhas e independente das peculiaridades individuais tinham que se adequar a instituição escolar tal como era apresentada. Muitas capacidades que não se encaixavam no currículo escolar foram ocultadas pois cada família buscava se encaixar (e encaixar os filhos) em um padrão social restrito. As relações verticais entre adultos e crianças privaram ambos de compartilharem linguagens, aprendizados e experiências, o que deve ter sido uma grande perda. Eu trabalho em uma escola há sete anos e aprendo com as crianças todos os dias.
Com o caminhar das novas gerações percebe-se uma horizontalização nas relações entre adultos e crianças. Enxergo isso em minha experiência pessoal, a relação dos meus pais com os meus avós sempre foi diferente da minha com os meus pais, no sentido da proximidade. E como ainda não sou mãe, observo de fora que a relação das crianças com suas famílias é bem diferente da que eu tive com meus pais quando era pequena. Hoje vejo crianças que podem tomar decisões que na minha época não cabiam a mim, como faltar na escola, fazer a lição ou até mesmo escolher uma atividade extra curricular.
Percebo também que há um novo olhar e escuta da sociedade como um todo para as crianças, o que tem como vantagem a troca de aprendizados e a variedade do repertório desde cedo. Outro aspecto que observo nas famílias com crianças pequenas, é a tentativa de desenvolvimento da autonomia. Os procedimentos usados, no entanto, nem sempre são os mais pertinentes para o alcance de tal objetivo.
Segundo o filósofo francês contemporâneo Gérard Gillot uma pessoa autônoma não é aquela totalmente independente, mas sim aquela que tem a capacidade de assumir suas interdependências sociais tendo consciência de suas implicações e do que está em jogo, ou seja, é quem sabe viver em sociedade. Para o autor, ser autônomo é existir por si mesmo mas não significa existir apenas para si.
Um fator bastante relevante para o desenvolvimento da autonomia nas crianças é a construção de "rituais" familiares como apoio nas tarefas domésticas cotidianas. Muitas vezes não percebemos mas as as crianças são colocadas como espectadoras em momentos nos quais poderiam ser os atores principais, quando fazemos “coisas” para elas e temos certeza de que já dariam conta de fazê-las autonomamente.
A participação da família na rotina é essencial para o desenvolvimento da autonomia das crianças, e as pequenas tarefas cotidianas podem aos poucos serem executadas sem ajuda de um adulto. Maria Montessori, famosa educadora italiana do século XIX e início do século XX publicou diversos trabalhos sobre a autonomia e desenvolvimento infantil. Ela criou uma tabela de tarefas de acordo com a idade de cada criança.A maioria são afazeres domésticos. O cumprimento destas tarefas irá ajudar na organização, rotina e desenvolvimento da autonomia. As idades são sugeridas pela educadora que estudou o desenvolvimento infantil de perto, mas é claro que pode ser adaptada às necessidades de cada família.
Referências.
GUILLOT, G. O Resgate da autoridade em educação. Porto Alegre: Artmed, 2008.
POLO,A. Quem manda aqui? A dúvida da família contemporânea. São Paulo. Escola da Vila. texto interno.
Imagem: https://goo.gl/images/NX2aGP
Tabela tirada do site: www.soescola.com
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